Eis que dancei um Bolero com um homem desconhecido em um Salão de Dança e, ao final da dança, quando voltávamos para minha mesa, ele disse: “Sabia que
o professor fulano inventou o Bolero Carioca?”. Bem, “fulano” é um professor do
Rio de Janeiro que, certamente, não inventou o Bolero Carioca, muito embora
tenha introduzido algumas inovações estéticas que, inclusive, são questionadas
por estudiosos mais ortodoxos. O homem tentou começar uma conversa transmitindo
algo que para ele era um conhecimento. Respondi apenas “Puxa”, senti que ele
queria discursar sobre o assunto e confesso que tive preguiça de continuar a
conversa, pedi licença e evitei o cidadão durante o resto da noite. Está aí um
tipo de diálogo inapropriado para o salão. Hoje, muitas escolas estão
espalhadas pelo país e boa parte dos frequentadores de bailes conhece apenas o
seu professor, que, não raro, professa quase cegamente a linha que escolheu transmitindo
informações equivocadas. Para ter uma conversa sobre Dança de Salão é preciso,
pelo menos, saber situar quem foi escolhido para professor no contexto geral da
área e já ter vencido o estágio de endeusa-lo com exclusividade. Hoje, existem
muitos professores e dançarinos excelentes, inclusive alguns pouco conhecidos
mais exímios que outros mais famosos. É salutar conhecer um universo um pouco
maior do que um professor, uma escola ou uma linha técnica. E permanece o fato
de que é muito mais seguro optar por outros assuntos quando estamos em um salão.
Seria preferível um comentário como: “Hoje este salão está excelente para
dançar, não acha?”. No âmbito da Dança de Salão noto frequentemente pessoas
tendo necessidade de falar sobre seus mestres, tentando mostrar sua
superioridade e trazendo informações que, muitas vezes, nem correspondem aos
fatos reais, como no caso citado. Algumas destas vezes cheguei a sentir nestes
discursos um efeito semelhante ao que já notei em religiosos, uma postura
dogmática, devoção exacerbada, nada eclética, reveladora do desconhecimento de
outros importantes representantes nacionais da Dança de Salão.
Evoluímos
o suficiente para saber, toda posição que não invada o direito do outro merece
respeito. Ninguém que tem ideias próprias gosta de ficar ouvindo discursos em
tom de alta sabedoria voltados a convencer as pessoas do entorno a cerca de convicções
diferentes das suas, especialmente se trazem informações sem respaldo na
realidade. Pessoas mais polidas não gostam de participar destes discursos nem
quando são a favor de suas convicções, simplesmente porque entendem que há uma
boa probabilidade desta conduta ser desagradável para alguém. É preciso muito
cuidado e respeito para saber quando e como tratar de assuntos como estes. Há
lugares e momentos em que estas conversas são apropriadas, o salão típico não
é.
Para
“puxar conversa”, é mais seguro escolher temas pouco comprometedores. Por
exemplo: num salão de dança frequentado por pessoas ligadas de alguma forma à
Dança de Salão profissional, é temerário fazer afirmações categóricas sobre qualquer
aspecto desta área. Quem quer mesmo abordar o assunto, fará de forma mais segura se tratar, por exemplo, desta forma: “Ouvi dizer que o professor fulano inventou o Bolero Carioca. Será
que é verdade?”. Ou: “Que linha técnica de dança você prefere: Carlinhos de Jesus, Jaime Aroxa ou outra?”. Desta forma, abre-se um diálogo que dará a todos a oportunidade de manifestarem
livremente sua opinião. Mas o melhor mesmo, é não entrar neste tipo de assunto em um Salão de Dança. Ali o objetivo principal é dançar.
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