9 de janeiro de 2018

A CAMINHO DE BUENOS AIRES...

Gosto dos argentinos. A culpa foi do tango, que amo escutar e dançar.
No baile não existe essa burrice competitiva que se vê em outros setores, principalmente no esporte. Mas no esporte a gente releva, é da sua natureza derrotar e vencer, então vale até gol de mão, do Maradona, um cara bem humorado, inteligente, com visão social.
No baile de tango é ao contrário. Quanto melhor a pessoa dança, mais admiramos. E os argentinos nisso são imbatíveis.
Depois deles, fora os notáveis colombianos, os melhores tangueiros de salão são os turcos. Não me pergunte a razão, nem tudo precisa ter explicação.
A admiração cria elos afetivos, principalmente quando você vai ao artista e elogia seu trabalho. O elogio é o combustível da arte, em qualquer campo onde ela se expressa. Razão pela qual artistas odeiam críticos, mesmo quando fingem que não ligam para o que falam, ou escrevem.
Nos últimos 15 anos fui a Buenos Aires com freqüência rotineira, nunca menos de duas vezes por ano. Com o recorde de seis viagens num único ano. Tudo por causa do tango.
MAIS DE 100 BAILES DE TANGO
Explico: Buenos Aires oferece mais de cem bailes de tango, que chamam de milonga, por semana. O problema dos fanáticos, entre os quais me incluo, é decidir a cada noite onde vai dançar.
Para quem deseja aprender, ou evoluir na dança, sempre há festivais e uma lista imensa de professores para escolher, com possibilidades para os mais variados estilos, do milongueiro tradicional, de salão, com abraço fechado e pés rentes ao piso,
ao show de palco, onde tudo se pode, principalmente mesclas de outras danças.
Com o tempo, você vai conquistando amigos, se integra, vai se sentindo em casa. Conheço brasileiros que têm até mesa preferida em alguns bailes. A gente aprende os nomes dos DJs, tem os preferidos, e como todo mundo passa a conhecer as estrelas do tango, mais e menos famosas, sempre encontráveis nos bailes.
UMA OBRIGAÇÃO
Hoje, entre os tangueiros, quem nunca foi a Buenos Aires é visto como alguém que não freqüentou a academia. Ir lá virou quase uma obrigação.
Mas nem tanto. Pesa também a paixão que passei a devotar à cidade, que foi planejada, tomando Paris como modelo, privilegiando o ser humano, enquanto no Brasil nossas cidades colocaram o carro em primeiro lugar, seguindo o modelo norte-americano. Isso explica a paixão. Só possível de entender quando a gente conhece um estilo de vida urbana que preserva lugares bonitos e hábitos cotidianos saudáveis, como a pausa no meio da tarde num café, sozinho ou com amigos.
A cidade é tão gostosa, com sua arquitetura preservada, praças e parques por todos os lados, que lá caminhar na rua é programa. Só cuidado com as lojas, algumas são irresistíveis para quem sofre de impulsos consumistas, meu caso.
Nas milongas, mesmo para quem sempre vai, é sempre uma renovada emoção sentir aquela atmosfera, com a música irresistível, a empanada quentinha, o modo elegante de trajar. Pisar na mesma pista dos melhores tangueiros do mundo. Compartilhar dos códigos de ética do baile, que são sagrados, sobretudo nos templos mais famosos, como o salão Canning, La Viruta, Villa Malcon, El Beso ou clube Gricell, entre muitos outros salões lendários do tango portenho.